Municípios portugueses equilibram dívidas e aumentam receitas
Municípios conseguem reduzir endividamento, mas dependência de transferências do Estado cresce.Os municípios portugueses apresentam sinais de uma gestão financeira mais sustentável nos últimos anos. Dados recentes indicam uma redução significativa no endividamento e um aumento expressivo nas receitas totais.
Contudo, a independência financeira das autarquias tem diminuído, com maior dependência das transferências do Estado, especialmente devido ao impacto da descentralização de competências. Este equilíbrio entre melhorias financeiras e desafios de autonomia é uma questão central no debate sobre a gestão municipal.
Nos últimos anos, a dívida total dos municípios registou uma redução de quase 40%, refletindo um esforço de ajustamento e consolidação financeira. Entre 2014 e 2022, essa dívida diminuiu cerca de 2,65 mil milhões de euros, o que permitiu a muitas autarquias melhorar a sua capacidade de investimento. Paralelamente, as receitas totais cresceram mais de 900 milhões de euros, atingindo cerca de 11,77 mil milhões de euros. Estes números demonstram uma evolução positiva no desempenho financeiro das autarquias.
Este avanço também se reflete na redução do número de municípios que ultrapassam os limites de endividamento legal. Em 2022, apenas 15 autarquias estavam nessa situação, comparativamente a 65 em 2014. Apesar disso, existem disparidades significativas entre os municípios. Alguns apresentam um rácio de passivo bastante baixo por habitante, enquanto outros continuam com valores elevados, apontando para desigualdades na gestão financeira local.
A análise das receitas dos municípios revela que o setor imobiliário tem desempenhado um papel crucial. O Imposto Municipal sobre Transações Onerosas de Imóveis (IMT) tornou-se uma das principais fontes de receita, ultrapassando até o Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI). Atualmente, o IMT representa cerca de 43% das receitas fiscais municipais, enquanto o IMI corresponde a 38%. Estes dados refletem o dinamismo do mercado imobiliário, que contribui significativamente para a saúde financeira das autarquias.
No entanto, este cenário positivo é contrastado pela redução da independência financeira dos municípios, que depende do peso das receitas próprias face ao total arrecadado. Este indicador tem vindo a diminuir, em grande parte devido ao aumento das transferências estatais para suportar a descentralização de competências. Nos municípios de maior dimensão, as receitas próprias representam uma parcela significativa das receitas totais, mas em concelhos mais pequenos, as transferências do Estado são a principal fonte de financiamento.
Nos municípios menos populosos, a dependência do Estado é evidente. Em algumas autarquias, as receitas próprias representam menos de 5% do total, enquanto nas mais dinâmicas, este valor pode ultrapassar os 80%. Nos municípios médios, observa-se uma divisão equilibrada entre receitas próprias e transferências estatais. Já nas grandes cidades, as receitas locais continuam a ter um peso predominante, mas a tendência de queda na independência financeira é notória.
Outro aspeto importante a considerar é a participação dos municípios no investimento público. Apesar de receberem apenas 15% das receitas públicas nacionais, as autarquias são responsáveis por cerca de metade do investimento público em Portugal. Este valor é superior à média europeia e destaca o papel crucial dos municípios no desenvolvimento de infraestruturas e serviços locais. Contudo, a limitada participação nas receitas nacionais coloca desafios à capacidade das autarquias para manter estes níveis de investimento.
O financiamento público municipal tem sido também impactado pelas receitas associadas a projetos do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR). Embora estas verbas sejam uma oportunidade para melhorar infraestruturas e modernizar serviços, levantam preocupações sobre os custos de manutenção que poderão surgir a médio e longo prazo. Este será um desafio adicional para as autarquias, que precisarão de encontrar formas de garantir a sustentabilidade destes investimentos.
Por outro lado, as receitas fiscais próprias continuam a ser uma fonte relevante de financiamento. Além do IMT e do IMI, impostos como a derrama e o Imposto Único de Circulação (IUC) também desempenham um papel importante. Estas fontes de receita variam significativamente entre os diferentes tipos de municípios, refletindo as características económicas e demográficas de cada região.
Apesar dos avanços, há espaço para melhorias na gestão e financiamento das autarquias. Comparando com outros países europeus, Portugal tem um modelo mais centralizado, com uma menor fatia das receitas públicas alocada aos municípios. Esta realidade contrasta com países como a Dinamarca ou a Alemanha, onde os municípios têm uma maior autonomia financeira e um papel mais destacado na gestão pública. Este menor nível de descentralização pode limitar a capacidade dos municípios portugueses para responder de forma eficaz às necessidades locais.
Os dados recentes mostram um progresso importante na redução das dívidas e no aumento das receitas dos municípios portugueses. No entanto, o aumento da dependência das transferências estatais e os desafios relacionados com a sustentabilidade financeira a longo prazo permanecem questões relevantes. Para garantir uma gestão equilibrada, será essencial apostar em políticas que promovam maior autonomia financeira, ao mesmo tempo que se assegura uma utilização eficiente dos recursos disponíveis.
O equilíbrio entre a capacidade de investimento, a independência financeira e a sustentabilidade a longo prazo será determinante para o futuro dos municípios, num cenário em que continuam a desempenhar um papel central no desenvolvimento do país.