Autarquias querem ter acesso direto ao fisco para cobrarem impostos em dívida

02-12-2024

Os municípios querem ficar dispensados de pedir autorização prévia à AT, como acontece atualmente.

A Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) avançou com uma proposta para que as autarquias tenham acesso direto à base de dados da Autoridade Tributária (AT). Objetivo: querem identificar e localizar bens penhoráveis em casos de cobrança coerciva de impostos como IMI ou IRC e taxas municipais, avança o jornal "Público".

A proposta de regulamentação já foi recentemente apresentada ao Governo pela ANMP, que espera que "esteja para breve a resolução deste assunto".

Os especialistas em Direito Fiscal ouvidos pelo "Público", alertam para os "perigos" deste acesso direto e sugerem "limites e cautelas" para que seja evitado um "acesso generalizado".

O documento define os termos e condições sobre quem pode aceder e o que é preciso fazer. Segundo o jornal "Público", os trabalhadores camarários devem receber formação da AT para consultar a sua base de dados, assim como determina o dever de sigilo (aplicação do Regulamento Geral da Proteção de Dados), depois destes terem acesso aos dados. Na proposta apresentada, os funcionários que tenham acesso devem também assinar um termo de responsabilidade.

A presidente da ANMP, Luisa Loureiro, autarca socialista, considera necessário este acesso para que os municípios possam levar a cabo a cobrança de determinados créditos. Para isso, querem ter informação sobre os bens dos devedores para poder executá-los.

Esta é uma reivindicação antiga da ANMP que foi de novo apresentada numa "reunião com a secretária de Estado dos Assuntos Fiscais", Catarina Reis Duarte. A associação comprometeu-se a apresentar uma proposta de regulamentação, refere a presidente da Câmara de Matosinhos.

Para serem tomadas todas as precauções ao dever de sigilo, na proposta apresentada pela ANMP terá de ficar registado "o número do respetivo processo executivo e a identificação dos trabalhadores", com acesso à informação, assim como a data e a hora a que estes tiveram acesso à base de dados.

Estas precauções não convencem o advogado Tiago Caiado Guerreiro, que considera o acesso "perigosíssimo". Caiado Guerreiro diz que os outros países "são muito cuidadosos nestas matérias". E justifica que em parte a sua posição se deve à "inexistência de fiscalização e de responsabilização".

Hoje em dia o acesso à base de dados pelos municípios é restrito: "tem de ser requerido e despachado no prazo de 30 dias pela administração tributária" e tem de ser autorizado caso a caso. Com a alteração em curso o acesso passará a ser livre, acrescenta o advogado.

A especialista em direito fiscal, Tânia de Almeida Ferreira, sublinha que "a lei já prevê que, para efeitos de realização de penhoras, as autarquias possam proceder à consulta, na base de dados da AT, de informação sobre o domicílio fiscal e existência, identificação e localização de bens do executado". Para a especialista, o acesso a estes dados por alguém externos à AT "faz sentido, mas com limites e cautelas".

E considera necessário, se avançarem estas alterações, ser "essencial criar um quadro sancionatório para a violação dos deveres de sigilo, quer para a própria autarquia, quer pessoalmente para os funcionários que violem os deveres a que estão obrigados".

Esta proposta da ANMP terá de ser submetida à Comissão Nacional de Proteção de Dados(CNPD), que diz que quando isso ocorrer emitirá o respetivo parecer. O Público recorda que, em 2016, o acesso à base de dados da AT não foi autorizado pela CNPD.

Fonte: Expresso